Pequena Reflexão fruto de uma Discussão entre a minha pessoa e umA procuradorA do M. P.
O Crime de Violência Doméstica, previsto no artigo 152º do Código Penal, fala-nos de maus tratos, físicos e psicológicos, praticados por um conjuge ao outro. Tais factos são punidos com pena de prisão de 1 a 5 anos.
Este crime é uma realidade que nada tem de actual, andando de mão dada com a civilização desde que se pode falar em união entre homem e mulher. Contudo, é um crime cuja prova é ainda dificilmente demonstrada, especialmente em sede de Audiência de Julgamento.
Imaginemos a situação em que uma mulher é brindada durante anos com insultos de toda a espécie e é impossibilitada de ter uma vida profissional, factos que lhe causam um estado depressivo profundo e permanente. Esta mulher, ao fim de muitos anos, reúne as pequenas forças que tem e participa os factos (passíveis de constituir crime de Violência Doméstica) às autoridades policiais.
Processualismos à parte, o caso chega às mãos do Procurador do Ministério Público, tendo inclusivé uma confissão do agressor marido, apenas feita para se justificar, mas que não deixa de ser um admitir dos factos a si imputados.
O Ministério Público chama Ofendida e Arguido, com o intuito de "promover" a Suspensão Provisória do Processo. Este instituto, tal como o nome indica, possibilita uma pausa nas "engrenagens do Tribunal", possivel apenas em crimes com pena de prisão até 5 anos, onde ao Arguido são exigidas regras de conduta e outras obrigações que, quando cumpridas, implicam o arquivamento do processo, não podendo mais ser reaberto.
Alguns dos pressupostos para a aplicação deste instituto são a concordância do Arguido e do Assistente, o grau de culpa não ser elevado e ser de prever que estas "obrigações de conduta" façam com que o Agressor não mais pratique tais factos.
Aqui surgem as minhas dúvidas.
1. Parece-me que um crime desta natureza devia ter uma pena máxima superior a 5 anos, desde logo impossibilitando esta possível "Suspensão".
2. O pagamento de 150 euros à Cruz Vermelha, fazer serviço comunitário na Agere ou pedir desculpa à Vitima (isto são meros exemplos de regras de conduta sendo que podem ser mais gravosas, o que não costuma suceder) não me parece ser suficiente para dar o "Aviso" ao Agressor da possibilidade de ser preso pelas suas atitudes.
3. O grau de culpa de quem pratica durante anos este Crime, crente da sua impunidade, sendo que ainda o pretende justificar (como se isso o ilibasse) parece-me ser um facto notório e, só por si, também deveria impossibilitar esta "Suspensão".
4. Mas o que me parece mais grave para a vítima é isto: O Assistente tem de concordar com a medida de suspensão. A Vítima, pelos anos que sofreu e pelos danos (essencialmente morais) que sofreu, tem toda a legitimidade em vir a juizo pedir uma avultada indemnização ao Agressor. Para tal (ter legitimidade para vir ao processo pedir essa indemnização) tem de se constituir Assistente no mesmo. Por ser Assistente pode recusar que seja aplicada este medida de "Suspensão", apesar de eu continuar a duvidar que, mesmo recusando, esta tomada de posição seja vinculativa mas, mesmo assim, pode. Mas o mais gravoso em todo este sistema é que a Vítima, a partir do momento em que se constiui Assistente, deixa de poder intervir no processo-crime como testemunha.
Em 99 % dos crimes de Violência Doméstica (aqueles praticados à noite, dentro de casa, sem os filhos verem) só existem 2 testemunhas: O Agressor (que no momento da verdade Nega tudo) e a Vítima.
Ora, se a vítima, mesmo prestando declarações em Audiência de Julgamento, não tem a certeza absoluta de ver o Agressor condenado pois é a palavra de um contra a do outro e, na maioria destes casos, in dubio pro reu, imaginemos então que prova se vai produzir se não houver relatórios médicos nem outras testemunhas e a vítima se tenha constituido Assistente para se ver ressarcida em forma monetária de tudo o que sofreu. Pois, NENHUMA!!!
Voltando ao caso exposto, a vítima vê-se perante duas situações:
Ou se constitui assistente para se mostrar contra a Suspensão Provisória do Processo mas não pode ser testemunha mais tarde,
Ou não se constitui assistente, mas não se pode pronunciar contra a Suspensão e não pode formular um Pedido de Indemnização.
Os nossos legisladores pensaram que o simples aumentar do limite máximo da pena de prisão para este Crime bastava para o eliminar ou para fazer mais "justiça" nestes casos, dando mais segurança à Vitima.
Parece-me que estamos muito, muito longe desse objectivo.
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