fontes de inspiração

literatura fontenária do mês


VII (2ª parte)
ODES





" quem é ela que diz amor como se fosse um advérbio de tempo
de designação de modo de afirmação de negação
de loucura?"
(Ode a Lisboa - pp.89)



já vos disse que isto não é comigo. analisar obras é cansativo e eu preguiço ao sábado. não obrigado, dispenso este trabalho. do que vos falo aqui é do prazer da leitura ou do meu radar-sonar que se exercita na triagem das palavras. mandriar é o verbo certo.
ao dispensar o meu tempo à leitura da poesia procuro entender melhor as lutas dos poetas na procura das palavras certas e da intensa necessidade do equilibrio. há alturas em que me desinquietam os cadafalsos, os cenários negros, a descrença, os labrintos escuros das almas e noutras delicio-me com os perfumes primaveris, na pureza dos gestos, na inocência e visão intimista. são o resultado das noites claras e visionárias dos autores.

nestas odes da ana alomé transparece a ansiedade do crescimento e a angustia do amadurecimento. procura refundar e reavivar os sentimentos que deixamos numa infância perdida, saudosa, mas inquestionavelmente perdida, " [...] cansei-me de amar rodeada de palavras / e de vento e de nada / alguém que não vem mais [...]" (ode al berto - pp. 21).
julgo que a par de umas quantas referências mais intensas sobre o incessante medo aos riscos de amar,
" [...] mas não tens coragem de desabitar o medo
e descobrir a matéria boa que fala amor
a medo medo medo" (ode anafórica - pp. 66)

temos mais luzes de esperança e de acesa vontade em acreditar.
" [...] de longe é visível que os nossos
corações se entendem como gente grande." (ode-casa - pp.54)

escrevo com um travo a cereja natural na boca, não porque as tenha provado hoje, mas porque a obra está organizada para que se sinta essa frescura, como fruta orvalhada numa manhã. a ana brinca com as palavras, estende os seus atributos pelos poemas, e depois tem o condão de organizar tudo de forma crescente. parece-me haver uma meticulosa escolha na cadência da estrutura do livro, esse objecto tão acarinhado pela autora. sim, até o livro-objecto se exalta. é uma peça que se maneja com cuidado, com medo de que se possam perder palavras ou desejos se não o tratarmos bem.

[e há o amor também. esse campo extenso de acabrunhadas figuras metafóricas que se expressam melhor na essência verdadeira, os sentimentos captados e vociferados nestas odes.
" [...] só o teu sorriso devolvido faz
não temer absolutamente nada." (ode pavese - pp. 24)

"sou um pinga-amor, amor
e o mel arde-me nos olhos
quando nos imagino aos beijos
num banco de jardim qualquer" (ode com mel - pp.74) ]

termino com a referência ao epílogo da obra. é um texto pleno de sagacidade. a astucia e a inteligência da autora, a par da sua humildade, permite-lhe fechar a obra com chave de ouro, como nos clássicos da poesia. é de uma clareza a sua definição da poesia que só por si atrairia qualquer leitor para este género. para mim foi uma renovação do meu prazer pela leitura e descoberta do poder da poesia. depois de ler estas duas obras (anáfora e odes), sou obrigado a agradecer este esforço e a deixar esta mensagem,

" [...] Tocaste no poema mais enigmático da carne
E és tu
Poeta
O poema" (ode nómada - pp.113)


Ode ao blog

leio blogues
alguns poucos certos
de blonds burnettes e red heads
muitas cabeças coroadas
com louros e flores tristes
amores

a alguns poucos certos
conheço a cara
mas os corações têm rostos
e muitos espelhos para eles
e reparei que sinto igual
tal qual diferente ainda

é que eu também tenho
um blog
que sinto sideral
pronto a explodir
tal qual
os outros.

se não tivessemos blogues
não sei o que estaíamos a fazer
agora que nele escrevo
e nele me estão a ler
enquanto outros seus escrevem
e daqui a pouco vou ler.

Odes, ana salomé (pp. 37)
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releia [ I - II - III - IV - V - VI - VII (1ª) - VII (2ª)]

4 Response to "fontes de inspiração"

  1. Gi says:

    Deixaste-me sem palavras, desta vez!Magnifico!
    bjo
    .gi

    S. G. says:

    :)

    a autora merece o teu elogio.

    bj

    Teté says:

    Mandriar, jogar, brincar com as palavras, enquanto se comunicam outros sentimentos a si própria e ao mundo. Com sabor de fruta fresca e um ligeiro travo a medo...

    Beijocas!

    S. G. says:

    sempre as tuas palavras tão simpáticas :)

    obrigado pelas tuas visitas.

    beijinhos

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